
Nesta segunda-feira, 10, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da SMTT, instaurada para investigar a arrecadação e aplicação dos recursos provenientes de multas de trânsito entre 2017 e 2024, iniciou o primeiro dia de oitivas com a presença de atuais e ex-gestores do órgão. Foram ouvidos o superintendente da SMTT, Nelson Felipe; a diretora administrativa e financeira, Elizangela Santos de Jesus; e o ex-diretor administrativo e financeiro, Carlos Alberto Xavier de Andrade, que exerceu a função entre 2 de janeiro e 30 de setembro deste ano.
Desvinculação das receitas
Durante a sessão, o principal questionamento dos vereadores foi sobre a aplicação dos recursos arrecadados com multas de trânsito e a desvinculação de até 30% dessas receitas, permitida pela Emenda Constitucional nº 93/2016. A norma autoriza a União, os Estados e os Municípios a utilizarem parte de receitas originalmente vinculadas, como as de multas, em outras finalidades, conforme a necessidade orçamentária. No entanto, segundo o Código de Trânsito Brasileiro (CTB, art. 320), os valores arrecadados devem ser aplicados exclusivamente em sinalização, engenharia, fiscalização e educação de trânsito.
O ex-diretor administrativo e financeiro da SMTT, Carlos Alberto Xavier, foi o primeiro a ser ouvido. Ele explicou que, durante sua gestão, foram desvinculados pouco mais de R$ 4 milhões, valor que, segundo ele, está dentro do percentual legal. “Não identificamos irregularidades. Levando em conta que a arrecadação mensal gira em torno de R$ 1,5 milhão, o que dá pouco mais de R$ 17 milhões ao ano, os R$ 4 milhões estariam dentro da proposta dos 30%”, afirmou.
Transição e demora nas respostas
O vereador Lúcio Flávio questionou como se deu a transição da gestão anterior para a atual e a demora nas respostas aos requerimentos da CPI. Carlos Alberto afirmou ter recebido os documentos no dia 24 de setembro, encaminhando-os ao setor responsável no mesmo dia, mas foi exonerado em 30 de setembro, antes de concluir o encaminhamento.
Motivos da exoneração e fontes de arrecadação
Questionado pelo vereador Pastor Diego sobre os motivos de sua exoneração, o ex-diretor afirmou que “o superintendente Nelson Felipe informou que a decisão partiu da prefeita e da diretora financeira”. Ele também explicou que não tem conhecimento sobre o repasse de multas para outras secretarias do município.
O vereador Sargento Byron – Estrelas do Mar questionou as principais fontes de arrecadação da SMTT. Em resposta, o ex-diretor financeiro, Carlos Alberto, explicou que a principal receita provém das multas de trânsito, além de recursos da COSIP (Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública), que possuem destinação específica para determinados contratos.
Fontes de recurso e a “fonte 1752”
A atual diretora administrativa e financeira da SMTT, Elizangela Santos de Jesus, foi a próxima convocada. Os vereadores também questionaram sobre o controle das despesas vinculadas e desvinculadas, incluindo a fonte 1752, código contábil que identifica os recursos provenientes de multas de trânsito.
O vereador Fábio Meireles questionou como os valores dessa fonte estão sendo utilizados, ao lembrar do caso em que os recursos foram usados para o custeio de uma viagem do diretor-executivo do Consórcio de Transporte Metropolitano, Hector Raul Medeiros. Elizangela respondeu que “a orientação que recebemos do superintendente Nelson Felipe foi para seguir estritamente o que está previsto na legislação e nas resoluções do Contran”, disse.
O vereador Sargento Byron também questionou sobre dois requerimentos realizados, nos quais, segundo ele, há necessidade de clareza sobre a segregação das despesas, ou seja, a separação contábil entre recursos vinculados (com destinação específica) e os que podem ser usados livremente. A diretora afirmou que as prestações de contas estão na balança contábil da SMTT, mas que ainda não foi localizado um relatório específico que detalhe as despesas desvinculadas. Ela também explicou que estão em fase de levantamento as informações a respeito das receitas vinculadas e desvinculadas dentro do órgão.
Superintendente da SMTT discute o uso de recursos e dificuldade no acesso aos documentos
O superintendente da SMTT, Nelson Felipe, foi o último orador. O relator da CPI, vereador Pastor Diego, explicou que não há nenhum envolvimento ou ligação de Nelson com os fatos, já que a investigação se dá entre os anos de 2017 e 2024, mas que o órgão foi chamado por conta da morosidade no envio dos documentos. O vereador iniciou os questionamentos sobre se há alguma auditoria interna a respeito de como a gestão passada utilizou o recurso público das multas.
“Não fizemos esse trabalho, pois, para os problemas que ocorreram na gestão anterior, existem os órgãos fiscalizadores para cuidar. Cuidamos do dia 1º de janeiro em diante. Sobre a desvinculação, que tínhamos 30% e aumentou para 50%, considero ser um valor extremamente alto. Não temos preocupação nesse sentido, pois esses 30% já suprem a demanda do órgão como um todo”, disse Nelson.
O vereador Lúcio Flávio questionou se, durante a transição, houve alguma discussão sobre o tema das despesas vinculadas e desvinculadas entre a gestão passada e a atual. O superintendente afirmou que não houve e que o foco foi no escopo administrativo. Nelson também apontou que muitos documentos solicitados pela CPI não estavam disponíveis de forma acessível, o que justificou a demora para o envio documental. “Localizamos pastas de arquivos físicos, sem critério de arquivamento, muitas delas jogadas. Precisamos de diversos servidores para nos ajudar na localização desses documentos”, apontou Nelson.
O vereador Fábio Meireles questionou se o superintendente havia identificado indícios de irregularidades na aplicação dos recursos entre os anos de 2017 e 2024. Nelson respondeu que não cabe a ele fazer esse tipo de análise. “Não tenho a capacidade técnica para julgar balancetes. O que posso afirmar é que, na minha gestão, estamos cumprindo a legislação. A fonte 1752 está aplicada legalmente. Hoje só temos as multas como principal fonte de recurso, com repasses da Secretaria da Fazenda”, explicou.
O superintendente também comentou sobre a exoneração do ex-diretor financeiro Carlos Alberto Xavier e a sindicância aberta na SMTT. “A sindicância não é disciplinar; trata-se de um procedimento de rotina administrativa. Cargos de confiança são de livre nomeação e exoneração, mas não há nada que macule a imagem de Carlos”, pontuou.
Fábio também fez críticas à morosidade no envio da documentação, explicando que, já que houve dificuldades na localização, isso poderia ter sido informado à CPI. O vereador Sargento Byron – Estrelas do Mar, que preside a Comissão, questionou sobre as contas específicas de multas. Nelson afirmou que o órgão possui mais de uma conta bancária, tanto na Caixa Econômica Federal quanto no Banese. “Estamos levantando informações sobre as contas, mas não há registros de repasses a outras secretarias. O que pode ocorrer são pagamentos de impostos realizados pela própria SMTT”, explicou. Nelson acrescentou que, atualmente, para o pagamento dos recursos das multas, há uma conta na Caixa Econômica e outra no Banese. Byron reforçou que esse questionamento se deu por conta da falta de resposta ao requerimento sobre as contas e da ausência de pedido de ampliação do prazo.
Contexto legal
O Código de Trânsito Brasileiro estabelece que a arrecadação das multas de trânsito deve ser aplicada exclusivamente em ações ligadas ao sistema viário, como sinalização, engenharia e educação. Entretanto, a Emenda Constitucional nº 93/2016 permitiu, até 31 de dezembro de 2023, a desvinculação de até 30% das receitas de impostos, taxas, multas e outras receitas correntes, concedendo flexibilidade orçamentária aos entes federativos.
Atualmente, esse percentual está em 50%. Existem exceções na legislação que não permitem a desvinculação, como as áreas da saúde e da educação, as contribuições previdenciárias e as transferências obrigatórias entre entes da federação com destinação específica.
Próximos passos
A CPI das Multas seguirá com novas oitivas. A próxima ocorrerá na segunda-feira, dia 17, a partir das 10h. Foram convocadas a diretora administrativa e financeira da SMTT entre os anos de 2018 e 2024, Wilza Cláudia Vaz Huerta, assim como a coordenadora orçamentária e financeira desse mesmo período, Maraiza dos Santos.
Foto: China Tom
Por: Camila Farias/CMA












