O Projeto Portal Girassol fez surgir cinco pequenos agricultores orgânicos no Perímetro Irrigado Califórnia, da Companhia de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Irrigação de Sergipe (Cohidro). Esses produtores, do município de Canindé de São Francisco, já tinham a intenção de converter suas atividades de horticultura e fruticultura aos métodos agroecológicos de produção, mas por iniciativa da Empresa, se organizaram em mutirão para construir estufas de plantio de mudas e agora se juntam em associação para requerer o registro no Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos, do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Para que eles consigam a autorização federal que os permita vender seus produtos, diretamente ao consumidor, como orgânicos e comercializar pelo Programa de Aquisição de Alimentos (PAA – Frutos da Terra), da Conab, vão precisar criar uma Organização de Controle Social (OCS), como explica o diretor de Irrigação da Cohidro, João Quintiliano.
“Os irrigantes podem optar pela formalização do cultivo agroecológico, desde que se mobilizem e assumam o compromisso de não usar agroquímicos e seguir técnicas de cultivo orgânico. A nossa Companhia presta todo suporte aos interessados, mas quem vai atestar a autenticidade do caráter orgânico da OCS, assim como fiscalizar sua produção, é o Ministério da Agricultura”.
Fator motivador para criação do grupo de orgânicos no Perímetro Califórnia, foi a chegada – em outubro de 2013 – do servidor Tito Reis. Técnico agrícola e acadêmico em Agroecologia, Tito identificou os produtores que com apreço à ideia dos produtos livre de agrotóxicos e os mobilizou.
“Prestando assistência a aplicação do receituário agronômico, ao qual fui designado em Canindé, conheci esses irrigantes. Alguns já tentavam fazer seus cultivos de forma orgânica, outros só tinham ouvido falar, mas reconheciam a importância e os benefícios que ela trazia. Foi assim que comecei a os organizar, alguns nem se conheciam e fiz esta ligação, que começou a tomar forma a partir do momento em que realizamos o mutirão para construção das estufas, que terminaram há cerca de uma semana”, contou o idealizador do Projeto Portal Girassol.
Para o gerente do Califórnia, Edmilson Cordeiro Bezerra, o Perímetro é terreno fértil para a aplicação da ideologia do cultivo orgânico por diversos fatores. “O uso do agroquímico na parte da agricultura convencional aqui é constante, mesmo com o acompanhamento da Cohidro através do receituário, mas já temos produtores que abandonaram este uso por indicação médica, devido a alergias causadas pelo contato com o agrotóxico. A chegada de Tito foi um auxílio muito importante, ele trouxe novas ideias e técnicas para poder incentivar nos agricultores algo que já vínhamos tentando há tempos, já que era uma reivindicação antiga deles, pois querem oferecer um produto sem risco a saúde de quem consome e de quem produz, além do valor que o produto agrega por ser orgânico”.
Mardoqueu Bodano, presidente da Cohidro, sempre foi a favor da iniciativa do cultivo orgânico nos perímetros administrados pela Companhia e vê com entusiasmo a iniciativa criada no Perímetro de Canindé. “Alegra-me ver que existem pessoas cada vez mais conscientes de que agricultura deve gerar produtos que servem não só para matar a fome de uns e gerar renda a outros. Tem muito mais coisas envolvidas no trato com a terra e a preocupação com a saúde – de quem nela trabalha e de quem dela consome – tem que ser levada em conta, sem falar nos benefícios ao meio ambiente que o cultivo agroecológico traz. Não podemos mais tapar os olhos para a realidade de que o agrotóxico, quando usado de modo indiscriminado, polui o solo, a água e até o ar que respiramos e compramos a briga, para que seu uso seja reduzido ao nível mínimo”.
Os pioneiros de Lagarto
Os produtores que estão sendo atendidos pelo projeto Portal Girassol em Canindé, antes de começarem seus cultivos devidamente orgânicos e a construção de suas estufas para mudas, já tinham ido a Lagarto, visitar o Perímetro Irrigado Piauí que em Sergipe representa a vanguarda no cultivo orgânico irrigado coordenado pela Cohidro. Lá conheceram a horta orgânica do irrigante João Pacheco, referência no cultivo agroecológico no município.
Tito Reis pontua que a visita técnica teve como meta colher informações e adquirir mais experiências com os produtores de Lagarto, que já eles têm bastante conhecimento em produções orgânicas, abrindo um canal para troca de informações e novas ideias entre os agricultores dos dois perímetros. Informações úteis e práticas, a exemplo da melhor forma de plantar e como utilizar os recursos orgânicos em suas plantações, para que possam assim ser aplicados também em Canindé.
A experiente
Maria Aparecida Nascimento Santana era uma das produtoras que mais cedo começaram a tentar introduzir o cultivo orgânico no Perímetro Califórnia. Além de ser a maior conhecedora das técnicas agroecológicas do grupo, é também, junto da Cohidro, uma mobilizadora e incentivadora dos seus colegas irrigantes para as atividades da associação que está prestes a nascer a partir do projeto Portal Girassol. Na sua horta de uma tarefa, ela já cultivava alface, coentro, pimentão, salsa, cebolinha e couve, e comercializava na feira livre da Cidade, ou na própria propriedade rural. Mais conhecida por Cida, a irrigante reconhece a chegada do novo técnico a Canindé o fator motivador da iniciativa orgânica.
“A Cohidro já me ajudava dando orientação para plantar orgânicos na minha horta, foi com os técnicos e agrônomos que aprendi, por exemplo, a preparar o substrato terroso orgânico. Mas foi quando Tito chegou e me juntou aos meus companheiros, daí vi que chegou aqui um grande parceiro, foi quando ele apresentou a ideia do projeto Portal Girassol. Eu já tinha um viveiro, mas era muito pequeno e colocava as bandejas no chão. Com a ideia de fazer um novo e com a Cohidro ajudando com os materiais, ficou mais fácil”, relatou Cida. Além da assistência técnica e a ajuda dos seus colegas do grupo para a construção da estufa, ela recebeu as telas para o revestimento da benfeitoria e canos de PVC para instalar prateleiras da Companhia.
Prezando pela saúde
A agricultora Quitéria da Silva Araújo quase não conseguiu fazer parte do Portal Girassol, pois era dever dos irrigantes entrar com a contrapartida da compra do madeiramento das suas estufas. Como ela e o marido, José Gonçalves, têm um lote no setor de sequeiro do Perímetro, onde a introdução de lavouras irrigadas é inviabilizada pela topografia e solo de cascalho, a renda familiar da família estava comprometida para fazer tal investimento. Foi graças à doação conjunta das secretarias municipais de Obras e Agricultura, do município de Canindé, que ela pode fazer parte do grupo. Com a água que recebe na sua propriedade, ela já tocava uma horta convencional antes mesmo de conhecer o projeto da Cohidro.
Para Quitéria, a saúde foi fator primordial para aderir ao projeto, mas a viabilização da estufa contribuiu muito. “A estufa é a coisa melhor de todo mundo, pois antes a gente comprava as mudas de outros e só tinha para comprar o que ofereciam. Agora a gente escolhe o que vai plantar, qualquer variedade e na quantidade certa, sem sobrar nem faltar. É muito bom plantar orgânico, que não prejudica a saúde de ninguém, nem plantando, nem para quem depois come”, revela a agricultora que planta pimentão, alface, cebolinha, rúcula, salsa coentro e couve, em sua horta de meia tarefa de solo de muito pedra, mas viabilizado pelo uso do substrato terroso que aprendeu a preparar com os técnicos da Cohidro.
Culturas integradas
Exemplo de interação entre culturas é a horta da irrigante Maria Luiza de Jesus Santos, outro membro do grupo. Ela optou pelo capim elefante como barreira natural, que protege o cultivo orgânico de pragas, do vento e serve de sombra em partes do dia. Por sua vez, a gramínea de grande porte é também usada para alimentar as ovelhas que o marido, José dos Santos, cria. Os ovinos, quando recebem essa alimentação sem aditivos químicos, são considerados como os melhores geradores de adubo para a produção agroecológica, e assim ocorre uma quase simbiose, manejada pelo ser humano em benefício da produção livre de agroquímicos.
Maria Luiza acredita no potencial econômico da produção e está ansiosa para começar a vender, definitivamente, seus produtos sob a denominação oficial de orgânico. “Tem procura, na feira as pessoas perguntam: ‘É com veneno ou sem veneno?’ Mas ainda não temos o documento que autoriza oferecer nossas verduras como orgânico nas feiras, mas com a nossa associação e com o acompanhamento da Cohidro, vamos conseguir”, aspira ela, que já tem coentro e cebolinha para vender, e está se preparando para colher os primeiros pés de alface plantados, também sem uso de defensivos químicos.
Família orgânica
Mãe e filho, Marcos e Marli Soares dos Santos Pereira, são outros dois integrantes da futura associação de produtores agroecológicos do Perímetro Califórnia. A característica que os diferencia dos outros membros, além da parceria familiar, é o reaproveitamento das linhas de espaçamento de uma antiga plantação de goiabas para a introdução dos novos canteiros da horta orgânica, que ficam protegidos pela barreira verde das frutíferas. Demonstrando bastante deficiência de nutrientes, as goiabeiras irão, em breve, produzir frutos orgânicos, depois de receberem toda ajuda oferecida pelo adubo natural do substrato terroso e o biofertilizante, também preparado pelos produtores sob orientação da Cohidro.
“Eu comecei a trabalhar com a horta convencional, mas passei para os orgânicos depois que eu fui aconselhada pela Cohidro. Meu filho antes não se dava bem com os produtos químicos, quando ele utilizava em alguma roça, passava mal, ficava doente, com dor de cabeça e hoje ele não precisa mais disso. Antes a gente tinha até medo de colocar um pé de alface na mesa, lavava mil vezes e ficava com medo, mas a gente hoje chega na horta, colhe uma folha e coloca na boca sem nenhum medo. E graças a Deus está dando tudo certo, dificilmente fica algo sem vender e o pessoal na feira livre já está sabendo que trabalhamos com os orgânicos, já estão ficando acostumados”, confidenciou a mãe e agricultora Marli, que considera a junção do conhecimento técnico dos profissionais da Cohidro com a mão de obra experiente dos produtores essencial para que o projeto tenha sucesso.
Fonte: Agência Sergipe de Notícias
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