O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação em caráter de urgência com pedido de proteção imediata das famílias extrativistas catadoras de mangaba do Município de Aracaju, no Bairro 17 de Março. A área de 236.218,96 metros quadrados doada ao município pela União detém a última reserva extensa de mangabeiras da cidade, onde estima-se, existam quase 5 mil árvores de vegetação nativa, além de nascentes e lagoas.
Na ação, o MPF afirma que a concessão do direito à moradia para os antigos ocupantes da área é extremamente necessária e o que o órgão já tinha ajuizado ação no passado para garantir esse direito. O MPF argumenta, no entanto, que a implantação do Projeto Habitacional Irmã Dulce dos Pobres, da Prefeitura de Aracaju, no bairro Santa Maria, da forma como está sendo feito, é um risco para a comunidade e para o meio ambiente.
Além disso, a implantação do projeto habitacional desobedece decisão judicial no processo que trata da ocupação urbana da Zona de Expansão de Aracaju, no qual a Justiça Federal determinou a proibição de qualquer obra na região até que sejam concluídos os trabalhos de macro e micro drenagem e instalação de sistema de esgotamento sanitário naquela parte da cidade. Trata-se de área com lençol freático aflorante, muitas lagoas e cordões dunares, o que leva a alagamentos constantes na região, resultado da ocupação desordenada e mal planejada.
Em um documento extenso e detalhado, o Ministério Público Federal enumera as irregularidades do processo de doação do terreno e do início da construção do empreendimento. O MPF age com o respaldo em documentações da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) além de documentos do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, que informou a inclusão dos catadores de mangaba no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos. Também respaldam a atuação do MPF nessa ação análises periciais realizadas por peritos enviados de Brasília pelos órgãos superiores componentes das Câmaras de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MPF (4CCR) e Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR), responsáveis pela áreas de proteção ao meio ambiente, patrimônio cultural e comunidades tradicionais
Ao longo de toda a argumentação, o MPF enfatiza a necessidade de compatibilizar o direito da população catadora de mangaba com o direito à moradia digna para as famílias hipossuficientes de Aracaju, que faziam parte de uma ocupação que ficou conhecida como “Invasão das Mangabeiras”.
A ação afirma que há áreas e projetos alternativos que seriam viáveis e aptos a contemplar os interesses dos dois grupos vulneráveis, de modo menos danoso para o meio ambiente e mais vantajoso para a comunidade dos bairros 17 de Março e Santa Maria, garantindo a continuidade do modo de vida e subsistência dos catadores e catadoras de mangaba.
São réus na ação a Prefeitura de Aracaju, a Empresa Municipal de Obras e Urbanização (Emurb), a Caixa Econômica Federal e a União.
Área das Mangabeiras
A região, conhecida como Mangabeiras, fica entre os bairros Santa Maria e 17 de março e, a partir dos anos 60, passou a ser utilizada por um grupo de famílias que se dedica à catação de mangaba. As famílias não moram no local mas, há pelo menos cinco décadas, cuidam dos terrenos e do manejo das mangabeiras nativas.
A atividade extrativista corresponde a pelo menos 60% da renda dessas famílias. A caracterização da comunidade tradicional, de acordo com o MPF, foi confirmada em diversos documentos, como o estudo “Mapa do Extrativismo da Mangaba no Litoral de Sergipe”, da Embrapa, que teve edições em 2010 e 2017, pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Sociobiodiversidade (CNPT) e por relatórios realizados por analistas periciais em Biologia e Antropologia da Procuradoria Geral da República (PGR).
A ação tramita na 1ª Vara da Justiça Federal com o número 0803409-82.2020.4.05.8500.
Fonte: Ascom MPF/SE