Ainda quando estava na Câmara dos Deputados, o vice-prefeito de Aracaju, José Carlos Machado, já lutava a favor do fim da cobrança das taxas de terrenos da Marinha. Nesta quinta-feira, 4, foi convidado para uma audiência pública em Brasília que teve como intuito instruir sobre a Proposta de Emenda à Constituição nº 53 de 2007 e Proposta de Emenda à Constituição nº 56 de 2009, essas que, em suma, tratam sobre a extinção do instituto do terreno de marinha e seus acrescidos e para dispor sobre a propriedade desses imóveis.
Fazendo parte das atividades da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), a audiência contou ainda com a participação de Cassandra Maroni Nunes, secretária de Patrimônio da União; o procurador do Ministério Público do Espírito Santo, Carlos Fernando Mazzoco; o engenheiro Obede Pereira Lima; e o representante da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Sebastião Constantino Dadalto.
O vice-prefeito de Aracaju, levando em consideração a realidade vivida não só na capital sergipana, mas inclusive em outras cidades brasileiras que passam pela mesma situação, levantou a questão de que a Lei que estabelece o território da Marinha foi estabelecida em 1946 e que, de lá para cá, muita coisa mudou, o que exige uma reorientação das normas vigentes. “São quase 70 anos que essa Lei vigora. Nesse longo espaço de tempo muita coisa mudou, inclusive as marés. Aquilo que era aplicado em 1946 já não pode ser emprego nos dias de hoje e isso é preciso ser levado em consideração”, disse Machado ao iniciar sua fala na audiência.
Apenas em Aracaju são cerca de 20 mil famílias atingidas pela Lei e que foram notificadas de que deviam à União. A Constituição estabelece a fixação de uma parcela de 17% do valor total da área pública concedida ao detentor do domínio. A ideia de mudança destes se justifica pelo benefício financeiro que o poder público usufrui sem empregar qualquer gasto, tendo em vista que o detentor recebe uma pequena porção de terra e fica por sua conta as construções e melhoramentos realizados.
“Conheci uma senhora que adquiriu sua casa há 30 anos através instinto Banco Nacional da Habitação. 20 anos depois de já ter pago o imóvel, veio a cobrança da União. Foi através do seu esforço que ela conquistou o bem e agora querem tirar dela de forma injusta”, exemplificou o vice-prefeito ao afirmar que o Governo precisa resolver a situação o mais rápido possível.
CBIC a favor da PEC
Sendo um dos maiores conhecedores do ramo da construção, o representante da CBIC, Sebastião Dadalto, discorreu sobre o assunto em defesa da posição de José Carlos Machado. Para ele, a entidade vê a situação com grande preocupação. “É um problema brasileiro que exige tratamento sério e solução rápida. Será que somos tão incompetentes a ponto de não acharmos uma solução para o fato em questão?”, questionou retoricamente, Dadalto.
Procuradoria Federal julga cobrança ilegal
Um dos pontos mais críticos da audiência girou em torno da menção de que a cobrança da taxa está sendo feita de forma ilegal. Um dos defensores da questão foi o procurador da República, Carlos Fernando Mazzoco. “As pessoas estavam sendo informadas por meio de editais. A desculpa era que não se tinha o endereço de cada uma, o que inviabilizada o contato pessoal. No entanto, independe disso, essas pessoas não tiveram meio para se defender. O que se percebe é um verdadeiro abuso e injustiça”, frisou o procurador.
Carlos Fernando salientou ainda que a Secretaria do Patrimônio da União (SPU), espera que o local seja ocupado para só então fazer a cobrança o que, para ele, é feito de forma ilícita.
Ilegalidade é comprovada por especialista
O Decreto-Lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, que dispõe sobre os bens de imóveis da União e dá outras providência, determina que terrenos da Marinha, são estabelecidos em uma profundidade de 33 metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha preamar-médio de 1831.
Tomando como base esse decreto, o Doutor em Engenharia, Obede Pereira Lima, um dos maiores nomes da área, deixou claro em seu pronunciamento que a cobrança “é um ato administrativo imperfeito, impróprio e ilegal”.
Durante os quase 15 minutos que teve posse da palavra, Obede Lima apresentou dados e explicações que demonstraram a razão do que afirmou. “O limite estabelecido foi preamar-médio de 1831. Já se passaram anos e com isso as marés também mudaram, o mar avançou e com isso é preciso essa linha seja transladada. Hoje, 95% desses terrenos estão em cima da praia, ou seja, por ser um espaço público, não se pode estabelecer como propriedade da União”, constatou doutor em engenharia.
União se defende
Representando o Ministério do Planejamento, a secretária do Patrimônio da União, Cassandra Nunes, expôs dados relevantes ao assunto e defendeu o lado que representa ressaltando que nos últimos tempos tem se trabalhado no planejamento da modernização. “Tenho que ressaltar que nem todos pagam essa taxa. Há isenção para aquele que recebe até cinco salários. Além disso, trabalhamos de forma a considerar a inclusão sócio-territorial”, rebateu.
Relator pede agilidade
O relator da PEC, senador Ricardo Ferraço (PMDB/ES) fechou a audiência pública afirmando que tudo o que foi exposto será considerado e que entende o lado da União, mas o desafio é grande, segundo ele. “Temos que descentralizar a responsabilidade. No meu entendimento, precisamos encontrar uma solução o quanto antes”.
Foto: Agência Senado